quarta-feira, 27 de julho de 2011

Guarda Chuva

 
— Você é poeta?

O professor Guilhermino César colocou meu pai numa sinuca de bico. Ele estranhou a provocação, se devia dizer que sim e ostentar orgulho ou responder que não e insinuar covardia. Optou por abandonar a gaveta e assumir os versos.

— Sim, sou.
— Tenho uma pergunta para ver se realmente é poeta. Uma só pergunta.

O pai, então com 21 anos e aluno de Guilhermino, entrou em pânico. Duas ou três perguntas não são perigosas, uma única pergunta é assustadora, parece que é caso de vida ou morte.

— Quantos guarda-chuvas você perdeu na vida?
— Você está de sacanagem comigo, professor.
— Não, querido, me responde, é o grande teste da poesia, não existe outro melhor.
— Acho que perdi mais de vinte.
— Boa média. Mostra que é poeta. A poesia é arte da distração, esquecer as coisas para dar valor às pessoas.

Ouvia essa história de meu pai quando lamentava por mais um guarda-chuva deixado na escola. A mãe me recriminava pela falta de atenção, e ele se envaidecia da minha vocação perdulária. Cochichava alegre em meus ouvidos:

— Você vai longe assim, meu filho.

Era para eu ter virado Goethe na adolescência. Extraviei mais de cinqüenta guarda-chuvas antes da maioridade. Às vezes tentava ser uma mãe comigo e me controlar, mas não havia jeito, bastava fechar o cabo que o objeto desaparecia de mim. A existência do guarda-chuva é inviável: seco, não pode ser aberto dentro de casa que dá azar; molhado, é posto de lado para não sujar o chão.

Hoje pode cair o mundo, desabar o oceano na cabeça, que vou para rua desligado do toldo preto. Ando encostado nas paredes. 1, 2, 3, 4 e fui. Pulo as poças a cada contagem e me protejo nas marquises. O curioso é que saio sem nada e volto sempre com um guarda-chuva. Acho que pego daquelas cestas de entrada de restaurante, de recepção de consultório, onde estiver. Não é de propósito, juro, difícil acreditar. Um sociólogo diria que é um ato ideológico: guarda-chuva não tem proprietário. Um neurologista confiaria na tese de que guarda-chuva não tem memória. O terapeuta avisaria que é um ato falho, para me vingar de todos que desperdicei na vida.

A verdade é que não penso, tomo, sou um cleptomaníaco dos bairros Bela Vista e Moinhos de Vento.

Fui ver o cabide, possuo vinte exemplares. Nenhum foi comprado. E não há como devolver. O sol do dia seguinte cancela a reabilitação.

Já imagino o que Guilhermino César diria de mim: coisa de prosador roubar guarda-chuva.
 
Furto Qualificado - Fabrício Carpinejar

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Dia do amigo!

"Centenas de pessoas atravessam a nossa vida diariamente. Umas passam bem devagar e aproveitam o trajeto ao nosso lado, outras estão sempre correndo e não tem interesse em observar o caminho conosco, e têm aquelas que decidem fazer o mesmo percurso que a gente pelo simples prazer da nossa companhia.

As pessoas que fazem parte da última categoria sabem que nem sempre será prazeroso. Elas também reconhecem que muitas vezes o caminho será complicado. Em outras situações irão questionar qual a razão de agirmos de determinada forma enquanto caminhamos. Mas nunca, em hipótese nenhuma vão achar que o passeio foi em vão.Amigo de verdade te leva a sério, te leva no riso, te leva no bico, mas te leva.

Te carrega pra vida toda!
"

(
Fernanda Gaona)

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Sonhos



Saímos pelo mundo em busca de nossos sonhos e ideais. Muitas vezes colocamos nos lugares inacessíveis o que está ao alcance das mãos”.
(Paulo Freire)

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Poemas

Confesso que eu gosto da poesia distraída
que não precisa fazer um esforço danado
pra deixar os sentidos cara a cara quando
tudo já está ali, esperando para ser dito.

Não sou dessa gente que aprisiona os gestos
em pequenos potes cheinhos de atitudes bem posicionadas.
Compactas.

Sem um abraço fazendo milagres, não aconteço.
Quero os gestos e silêncios libertos, tortos e (docemente)
interrompidos.

Gosto de passar a língua nas distrações da vida e eternizar
o sabor da poesia no momento em que o mundo vira palavra.
Palavreio com verdade qualquer pedacinho de sentimento.
Pra mim, essa é a atitude mais livre do mundo.

É que tem gente que vive calando poemas. Eu ouço todos
para compor os meus passos e aumentar a minha alma.

Priscila Rôde

terça-feira, 5 de julho de 2011

É pouco...

"O que eu gostaria de ser era uma lutadora.Quero dizer, uma pessoa que luta pelo bem dos outros.Isso desde pequena eu quis.(...)No entanto, terminei sendo uma pessoa que procura o que profundamente se sente e usa a palavra que o exprima.
É pouco, é muito pouco."
 
(Clarice Lispector)

sábado, 2 de julho de 2011

Cora Coralina



Não sei... se a vida é longa ou curta demais para nós. Mas sei que nada do que vivemos tem sentido se não tocamos o coração das pessoas."

 (Cora Coralina)

Nosso II Encontro Literário


"Não lemos e escrevemos poesia porque é bonitinho. Lemos e escrevemos poesia porque somos membros da raça humana e a raça humana está repleta de paixão. E medicina, advocacia, administração e engenharia são objetivos nobres e necessários para manter-se vivo. Mas a poesia, beleza, romance, amor...é para isso que vivemos."
(Do filme: Sociedade dos Poetas Mortos)

Analisando a Canção do Exílio

 Semântico.  O poema e constituído de rimas e repetição
O poema é constituído de rimas e repetições da palavras. No estudo semântico das palavras os parônimos são palavras  parecidas na escrita e na pronuncia, mas com sentido diferente.  Na canção do Exílio com a sua parodia fica bem clara o uso de parônimos e é colocado de madeira a criar uma sátira. As palavras grifadas têm a pronuncia  parecida: fazendo que sejam parônimas da canção do  Exílio.

A forma poética da “Canção do Exílio” (AMARAL: 119) é nacionalista romântica, demonstrando um  forte sentimento de saudade da pátria amada em  comparação a sua atual localização, que dava - se em Portugal.
Observa-se as características românticas desta  poesia  da seguinte forma: valorização do sonho e da morte;Ele sonha com os céus estrelados da sua pátria e seu retorno antes da sua morte ;da natureza no canto dos pássaros ,nas florestas e vales cheios de vida ,no subjetivismo com a falta de certeza, se o sabiá realmente canta nas palmeiras de sua terra natal ,no individualismo e no tempo com saudosismo que a poesia por si só deixa bem claro e evidente ;ora é o sentimento principal da canção. O poema foi escrito enquanto Golçaves Dias estava em Portugal cursando Direito.
O poema pertence ao gênero Lírico, que não conta uma história e sim exprime um estado de ânimo de um “eu”, o “eu” lírico.Os elementos de cenário servem como metáforas desse estado de espírito e tem papel muito mais importanbte do que cenários onde se desenrola uma história.
O poema começa com o uso de uma epígrafe, prática comum no romantismo, que possui função semelhante à clave musical, servindo para sugerir o tom da interpretação do poema.

O tema é a saudade da pátria e a valorização da  fauna e a flora Brasileira que em versos redondilhos maiores, são relatados, descrevendo as palmeiras, o canto dos pássaros que só cantam  lindamente no Brasil em nenhum outro lugar segundo Gonçalves Dias.


O poema, por conta de sua contenção e de sua alusão à pátria distante, tema tão próximo do ideário do Romantismo, tornou-se emblemático na cultura brasileira. Tal caráter é percebido por sua freqüente aparição nas antologias escolares, bem como pelas inúmeras citações do texto presentes na obra dos mais diversos autores brasileiros. Sua temática é própria da primeira fase do Romantismo brasileiro, em sua mescla de nostalgia e nacionalismo. Gonçalves Dias compôs o poema cinco anos depois de partir para Portugal,
O poema “Canção do exílio”, foi escrito pelo poeta brasileiro Gonçalves Dias em 1843, na cidade de Coimbra, e é o primeiros poema do livro “Primeiros Cantos”. Trata-se da obra prima desse poeta brasileiro, pertencente à primeira geração romântica, como um dos mais famosos poemas da língua portuguesa no  Brasil.O segundo poema é o “Canto de regresso à pátria”, escrito pelo poeta, ensaísta e dramartugo brasileiro Oswald de Andrade. Ele foi um expoente e promotor da Semana de Arte Moderna de 1922, na cidade de São Paulo, e pertenceu à primeira geração modernista. Oswald de Andrade foi considerado, já em sua época, o mais rebelde de seu grupo.

Na análise do poema Gonçalino, verifica-se que todos os versos estão metrificados na classificação de sete sílabas poéticas – ou seja, redondilha maior – o verso de sete sílabas é o mais simples, do ponto de vista da metrificação. É talvez por isso que ele seja tão comum nas cantigas de roda e canções populares, uma vez que é muito fácil de se cantar.Este é o caso de “Canção do exílio”, uma cantiga que se destina a contemplar e exaltar a natureza, características da primeira geração romântica. O poeta estava estudando em Portugal, na época em que escreveu esse poema, refletindo sentimentos de saudade e patriotismo.Observa-se, dessa forma, como o poeta procura representar a majestade de sua pátria através das figuras da palmeira e do sabiá. A primeira, pela imponência que essa árvore possui (alta e de tronco grosso) – os índios chamavam o Brasil de Pindorama, que significava lugar das palmeiras. A outra figura utilizada é a do sabiá, que apesar de possuir um canto relativamente triste – que, inclusive, pode revelar a tristeza do poeta maranhense, em virtude de sua saudade – é caracterizado pela beleza de suas penas com tons amarelos  e a graciosidade do seu gorgeio.O uso das palavras “lá” – Brasil – e “cá” – Portugal – revelam saudosismo pelo afastamento geográfico do poeta em relação à sua pátria. Esse afastamento acaba resultando no isolamento físico e psicológico, revelado pelo uso da palavra “sozinho”, reforçado pela utilização do sinal dos travessões (-sozinho, à noite-).Com relação ao “Canto de regresso à pátria”, verifica-se que esse poema está dialogando com o poema de Gonçalves Dias.
Entretanto, como se verificou acima, o diálogo pode ser contratual ou polêmico. Como será visto adiante, o poema de Oswald de Andrade está construindo um sentido oposto ao romântico, porque ele não está celebrando ufanisticamente a nação, muito pelo contrário,ironizando-a.Sabe-se que os modernistas da terceira geração eram conhecidos pelo anarquismo e lutavam contra o tradicionalismo; usavam de paródia, de humor, de verso livre, isto é, sem uso da métrica. Rejeitavam, ainda, as normas estéticas consagradas,caracterizavam-se pela antigacademicismo e antitradicionalismo.Quando se lê o poema do autor do Manifesto Antropofágico, aparentemente ele segue a tradição fazendo versos nos mesmos padrões dos poetas românticos – o que poderia estar em contradição com seu estilo, pois no tempo de Oswald os versos eram feitos na ‘forma livre’. Contudo,o poeta modernista usa esse padrão com a finalidade de chamar a atenção ao seu poema, pois ao mesmo tempo em que contrói um poema nos moldes da tradição (quanto à forma) ele ironiza o seu conteúdo.Este ensaio tenta provar que a Canção do Exílio, de Gonçalves Dias, ao privilegiara natureza tropical como metáfora da representação nacional, além de se inserir no
tradicional projeto de edenização da natureza local, por si só acabou construindo uma tradição própria dentro das letras brasileiras.O salto para o amadurecimento impunha o enfrentamento do ridículo, mesmo na sua versão trágica.De nenhuma obra de Oswald (poesia, teatro ou ficção narrativa) se faz ausente o condimento estético dessa mistura. Disso provém sua singularidade. O riso, a ironia, a paródia se tornam recursos que se juntam ao aprofundamento da dor em sua dimensão individual ou coletiva. Em síntese, o riso, na obra de Oswald, traduz o instrumento de defesa contra a amargura trágica de um ser "desidentificado", traço constitutivo da brasilidade. É por esse atalho que segue a escrita de Oswald de Andrade. A ironia cáustica de História Pátria ("Lá vai uma barquinha carregada de aventureiros / Lá vai uma barquinha carregada de bacharéis /.../") e a paródia Canto de Regresso à Pátria ("Minha terra tem palmares / Onde gorjeia o mar / Os passarinhos daqui / Não cantam como os de lá /.../") são exemplos típicos. De maneira contundente, os escritores modernistas, ao retomarem a temática da identidade nacional, se empenharam em tentar fugir da armadilha, construída pelo imaginário romântico, em torno do binômio identidade / natureza. Sobre isso, Antonio Candido é bastante enfático e esclarecedor:
"À idéia de pátria se vinculava estreitamente a de natureza e em parte extraía dela a sua justificativa. Ambas conduziam a uma literatura que compensava o atraso material e a debilidade das instituições por meio da supervalorização dos aspectos regionais, fazendo do exotismo razão de otimismo social."

Autores: Andressa Dias Geraldo, Nayara Alves Negrão e Thaís de Lima Kuceki.

O êxodo em diferentes contextos



O ÊXODO EM DIFERENTES CONTEXTOS

Vidas Secas – Graciliano Ramos
Na obra Vidas Secas é revelada a fuga de uma família da seca do sertão, onde a família de Fabiano sai de sua terra árida a procura de uma terra melhor, longe da seca que tem os consumido.
“Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos.
Ordinariamente andavam pouco, mas como haviam repousado bastante na areia do rio seco,
A viagem progredira bem três léguas. Fazia horas que procuravam uma sombra.”
(RAMOS, p.01)
A família é formada por Fabiano, o pai, um homem simples, de pouca fala, com o pensamento que nasceu para trabalhar e ser como um bicho. Um homem sem a visão do valor que tem como ser humano. A mulher de Fabiano, sinhá Vitoria, sem muitos planos, apenas um sonho, uma cama como o das outras pessoas. Um casal que não sabe demonstrar os sentimentos, que não tem um dialogo, apenas murmúrios. Fabiano tem dois filhos, os quais não são mencionados os nomes, apenas é demonstrado que são crianças comuns que fazem do barro seco, um brinquedo e de pequenos momentos, grandes alegrias.O filho mais moço deseja sobremaneira ser igual ao pai, tenta mostrar em uma certa situação a coragem e astucia igual ao seu pai, porém seus planos não saem bem e é ridicularizado pelo irmão.Já o filho mais velho aparenta ser mais independente, solitário, contando apenas com a fiel companhia de sua cadela, Baleia. Ela, a cadela, tem papel importante na história, talvez até mais que os próprios meninos, por ser revelado seu nome.
A morte da Baleia é narrada em todos os detalhes. Esta foi adoecendo e conseqüentemente emagrecendo, perdendo pelos. Fabiano tentando tratar a cadela usou da medicina local com ervas, porém de nada adiantou. O fim era inevitável e Fabiano decidiu sacrificá-la. Enquanto sinhá Vitoria tenta distrair os meninos e abafar o som dos tiros que vinham pela frente, Fabiano foi preparar a espingarda para sacrificar Baleia. A narração do momento em que o tiro é lançado contra a pobre criatura até o momento em que ela morre causa pesar naquele que lê, expondo mais uma vez a importância da Baleia no contexto. Após o tiro, a narração vira-se para os sentimentos de Baleia e o que se passa em sua cabeça, em primeiro momento a raiva de Fabiano, seguida da preocupação com as responsabilidades e a falta de força para se mover. Baleia é lembrada  com grande dor até o final da história pelos personagens.
“Baleia queria dormir. Acordaria feliz, num mundo cheio de preás.”
(RAMOS, p. 91)
A seca continua e a família de Fabiano se vê em crise mais uma vez. Tentando lutar para sobreviver, a família deixa sua casa e parte ao encontro de uma terra melhor. Desejando viver apesar da seca que inapelavelmente desejar tragar a vida do pobre sertanejo.
“Podia continuar a viver nem cemitério?
Nada o prendia àquela terra, acharia um lugar menos seco para enterrar-se.”
(RAMOS, p. 118)
As Vinhas da Ira – John Steinbeck

         A história central é de uma família de trabalhadores rurais que sai de Oklahoma para Califórnia em busca de melhores condições de vida. A família percorre sua jornada desesperada atrás dos algodoais da Califórnia deixando para trás a secura das terras de Oklahoma e o pó que domina a terra. Com a família Joad seguem outras famílias, tornando-se uma grande família:
"as vinte famílias tornavam-se uma só família, os filhos de uma eram filhos das outras, e de todas. A perda de um lar tornava-se uma perda coletiva,                                                                             e o sonho dourado do oeste um sonho coletivo" (pg. 262).
A família Joad é formada pela mãe, seus Tom e Rosa de Sharon, o tio John e o avô Joad e a avó Joad. A figura da mãe tem grande importância, pode-se dizer que ela assume o papel central com Tom, pois ela retrata a força, e esperança na família.
Tudo o que nos resta é a família, é a nossa união. Não tenho medo de nada, enquanto estivermos todos juntos. Não quero que a gente se separe. (...)                                                                        com a minha família é diferente:  ela não pode desunir-se.                                                                                                 Prefiro rachar a minha própria cabeça, mas não vou permitir isto (p. 228).
“Virá o tempo em que tudo isso vai mudar,                                                                             quando a morte será parte da morte geral,                                                                                    e o luto uma parte do luto geral e morte e luto são as duas partes de uma mesma coisa. E aí não vai ter mais coisas pessoais. E aí uma dor não mais doerá tanto,                                                                                              porque não será mais apenas uma dor pessoal..." (pg. 282).
        No início da viagem, a família enfrenta a primeira morte de sua trajetória, a do avô Joad, o que acaba causando um descontrole emocional da avó. Antes de atravessara fronteira, a avó Joad também falece. Rosa de Sharon perde seu bebê, o que acaba por seu um meio de ajudar um homem necessitado. Uma grande enchente força a família a fugir mais uma vez. Chegando a um galpão, a família se depara com um garoto e seu pai, que há dias não se alimenta. Em um ato de compaixão, Rosa de Sharon, que foi impossibilitada de amamentar, agora pede para que todos os homens saiam do galpão e alimenta o homem.
“Então, com vagar, dobrou os joelhos e deitou-se ao lado dele. O homem esboçou um movimento negativo com a cabeça, um movimento fraco e muito lento. Rosa de Sharon desfez-se do cobertor, deixando os seios desnudos. – tem que ser – falou, aproximando-se mais dele, e puxando a cabeça para si. – Assim – disse. (...) Ergueu os olhos e seu olhar percorreu o galpão escuro e seus lábios cerraram-se e ela sorriu misteriosamente. (p. 628-629)                                                                                                                                    
A obra termina com esta cena que apesar de todas as circunstancias ruins que os cercam, a compaixão é lembrada pelos seus personagens.
O êxodo nas duas obras apesar de ser em diferentes países demonstra a busca pela melhor condição de vida. Na obra de Graciliano Ramos podemos observar uma família brasileira fugindo da grande seca do sertão para uma terra desconhecida. Já em As Vinhas da Ira, a família americana Joad e outras famílias fogem da empoeirada Oklahoma para a verdejante Califórnia.
Autores: Andressa Dias Geraldo, Nayara Alves Negrão e Thaís de Lima Kuceki.

Antologia Comparada Parte III

AS MULHERES DO REALISMO: CAPITU E LUÍSA


Comecemos falando de Dom Casmurro (Bento Santiago), o narrador, por ele que conhecemos Capitu, quem revela ao leitor a imagem e as ações que envolvem a protagonista, por isso só conhecemos Capitu através do narrador, tornando-se uma personagem sem voz na narrativa.
Ele faz uso de estratégias fazendo com que o leitor ora duvide, ora acredite na inocência de Capitu, acusada de adultério pelo marido. Marta de Senna (2001) fala dessa habilidade do narrador de tentar induzir o leitor.
Dom Casmurro é um narrador congenitamente embusteiro, já que nasce na narrativa e para a narrativa explicando-se através do engodo: adverte que seu cognome, "Casmurro", não deve ser entendido como está nos dicionários, isto é, "teimoso", "obstinado", "cabeçudo" — que é o que ele é; e, sim, como "homem calado e metido consigo" (capítulo I) — que é o que não é, pois é o único dono da voz nesse romance onde Capitu é implacavelmente silenciada. (Senna, 2001, p. 1)
Capitu nos é apresentada da seguinte maneira: na adolescência é esperta, inteligente, sabe contornar situações, coisa que Bentinho não era capaz de fazer, como no momento em que os enamorados estão no quintal de mãos dadas e de olhos fixos um no outro, ―as mãos, unindo os nervos, faziam das duas criaturas uma só, mas uma só criatura seráfica. (MACHADO DE ASSIS, 2004, p. 29)
Capitu via Bentinho, não só como amigo, mas também, seu futuro esposo. Diante da notícia que Bentinho iria para o seminário, a personagem é perspicaz em arquitetar planos para impedi-lo de se tornar Padre.

O narrador nos mostra a atitude de Capitu, quando esta começa a arquitetar o plano que impediria Bentinho de ir para o seminário e, o mesmo faz questão de ressaltar como Capitu o persuadi-o a falar com José Dias para que este possa advogar para Bentinho na tentativa de fazer com que D. Glória desista da promessa de mandar o filho para o seminário, sendo assim observamos a conversa entre Capitu e Bentinho:

Como vês, Capitu, aos quatorze anos, tinha já idéias atrevidas, (...) mas eram só atrevidas em si, na prática faziam-se hábeis, sinuosas, surdas, e alcançavam o fim proposto, não de salto, mas aos saltinhos. [...]
- Posso confessar?
- Pois, sim, mas seria aparecer francamente, e o melhor é outra coisa. José Dias...
- Que tem José Dias?
- Pode ser um bom empenho.
- Mas se foi ele mesmo que falou...
- Não importa, continuou Capitu; dirá agora outra coisa. Ele gosta muito de você. Não lhe fale acanhado. Tudo é que você não tenha medo, mostre que há de vir a ser dono da casa, mostre que quer e que pode...
- Não acho, não, Capitu.
- Então vá para o seminário.
- Isso não.
- Mas que se perde em experimentar? Experimentemos; faça o que lhe digo. (MACHADO DE ASSIS, 2004, p. 37-38)

Em certos capítulos percebe-se que o narrador revela que Capitu possui uma personalidade forte que concede a ela a capacidade de se impor diante das coisas que lhe eram negadas, permitindo que ela impusesse sua opinião sobre as coisas, é o que a torna uma mulher transgressora ao padrão social do século XIX.
Uma vez que seus comportamentos não são próprios de uma mulher que vive nessa sociedade do século XIX. No capítulo ― As curiosidades de Capitu, observamos com nitidez que Capitu transgride porque sabe que possui capacidade de ir além do que lhe é permitido.
As curiosidades de Capitu dão para um Capítulo. [...] gostava de saber tudo. No colégio onde, desde os sete anos, aprendera a ler, escrever e contar, francês, doutrina e obras de agulha, não aprendeu, por exemplo, a fazer renda- por isso mesmo, quis que prima Justina lhe ensinasse. Se não estudou latim com o Padre Cabral foi porque o padre, depois de lhe propor gracejando, acabou dizendo que latim não era língua de meninas. Capitu confessou-me um dia que esta razão acendeu nela o desejo de o saber. (MACHADO DE ASSIS, 2004, p. 54)
O fato de Capitu estar desejando sempre saber e aprender, mostra que ela sabe se impor em relação aos limites que lhe são dados. Podemos considerá-la então, como a ação da narrativa, pois esta, embora não tenha voz no texto, ela se sobressai a Bentinho. A personagem acaba assumindo na trama o papel de protagonista, ou seja, Bentinho tem a palavra, mas Capitu tem a ação.
É possível perceber que a personagem é tratada de outra forma, no sentido de que ela se reconhece como indivíduo que tem sua própria opinião e a manifesta seja qual for. Até quando Capitu é descrita observamos que se prioriza não apenas a sua beleza:
Não podia tirar os olhos daquela criatura de quatorze anos, alta, forte e cheia, apertada em um vestido de chita, meio desbotado. Os cabelos grossos, feitos em duas tranças, com as pontas atadas uma a outra, à moda do tempo, desciam-lhe pelas costas. Morena, olhos claros e grandes, nariz reto e comprido, tinha a boca fina e o queixo largo. As mãos a despeito de alguns ofícios rudes eram curadas com amor... (MACHADO DE ASSIS, 2004, p. 27)

Isso nos dá a possibilidade de dizermos que Machado de Assis concebeu Capitu com uma singularidade que a faz ser moderna para o seu tempo e espaço.

Desde sua adolescência, Capitu era uma personagem determinada, e não hesitava em assumir uma atitude que, para sua época, era muito avançada. Um dos exemplos está no capítulo 33 intitulado ―o penteado, momento em que Bentinho se coloca a trançar os cabelos de Capitu, depois que o mesmo termina o penteado ela toma a iniciativa e dá o primeiro beijo em Bentinho:

Capitu derreou a cabeça, a tal ponto que me foi preciso acudir com as mãos e ampará-la; o espaldar da cadeira era baixo. Inclinei-me depois sobre ela, rosto a rosto, mas trocados, os olhos de um na linha da boca do outro. Pedi lhe que levantasse a cabeça, podia ficar tonta, machucar o pescoço. Cheguei a dizer-lhe que estava feia; mas nem esta razão a moveu.
- Levanta, Capitu!
Não quis, não levantou a cabeça, e ficamos assim a olhar um para o outro, até que ela abrochou os lábios, eu desci os meus, e... Grande foi à sensação do beijo; (MACHADO DE ASSIS, 2004, p. 59)


Não só a iniciativa do beijo pode ser considerada nesse episodio, mas também a forma como Capitu disfarça a situação quando sua mãe, D. Fortunata, se aproxima:

Ouvimos passos no corredor; era D. Fortunata. Capitu compôs-se depressa, tão depressa que, quando a mãe apontou à porta, ela abanava a cabeça e ria. Nenhum laivo amarelo, nenhuma contração de acanhamento, um riso espontâneo e claro, que ela explicou por estas palavras alegres:
-Mamãe, olhe como este senhor cabeleireiro me penteou; pediu-me para acabar o penteado e fez isto. Veja que tranças!
-Que tem? Acudiu a mãe, transbordando de benevolência. Está muito bem, ninguém dirá que é de pessoa que não sabe pentear.
- O que, mamãe? Isto? Redargüiu Capitu desfazendo as tranças. Ora, mamãe! (MACHADO DE ASSIS, 2004, p. 60)

  Desde o momento em que Capitu soube da notícia que Bentinho iria para o seminário até o momento em que ela se casa com o mesmo, percebemos que Capitu não mediu esforços em fazer com que Bentinho se casasse com ela, pois, não tendo um plano que impedisse que Bentinho fosse para o seminário, esta fez com que Bento ficasse preso a ela por uma promessa de casamento, que ela induziu o rapaz a fazer e, além disso, enquanto Bentinho estava no seminário, Capitu se aproximou de D. Glória (mãe de Bentinho) a fim de mostrar à futura sogra, que ela era uma boa moça e conseqüentemente seria uma boa esposa.
A protagonista Luísa é o centro da narrativa, pois é ela a personagem central do inicio ao fim da obra. Ela é apresentada como “a burguesinha da Baixa” por conseqüência da cidade onde a obra é contada (Lisboa, Cidade Baixa) é também uma senhora sentimental, mal-educada sem valores espirituais ou senso de Justiça. Seu comportamento, por vezes, era revelado como uma atitude transgressora, pois rompia com a ordem social estabelecida.
Luísa era noiva de Basílio, mas após este romper a relação, ela casou-se com Jorge, engenheiro de minas que ela conheceu. Sua vida tranquila de leitora de folhetins é alterada pela viagem do marido e o retorno do primo a Portugal. O motivo que a leva a se entregar a Basílio, de acordo com as reflexões de Eça, nem ela sabia. Uma mescla da falta do que fazer com a "curiosidade mórbida em ter um amante, mil vaidadezinhas inflamadas, um certo desejo físico...".
O perfil de Luísa pode ser analisado através das leituras que a mesma faz. Percebe-se que ela possuía gosto para ficção romântica. Dentro da narrativa, são as leituras eminentemente românticas que ela faz que moldam sua personalidade, revelada como frágil e sonhadora.
Essa identificação de Luísa com a ficção romântica, levando-a a incapacidade de separar a fantasia da realidade, é uma das causas do adultério na medida em que Basílio se aproveita dos sonhos da prima no processo de sedução. Não apenas os devaneios de Luísa com aventuras amorosas, mas também o desejo de evadir-se no espaço, de conhecer os lugares descritos nos romances – a Escócia e, sobretudo, Paris – auxiliam Basílio nos seus planos de conquista. [...] (BELLINE, 1997, p. 522)

Além dos trabalhos domésticos, que se resumiam em organizar a casa, cuidar da educação dos filhos e servir ao esposo, as mulheres passeavam por alguns espaços públicos, eram vistas em associações de caridade e grupos religiosos. Porém, a ociosidade de Luísa, deve-se ao fato, de a mesma não participar de nenhuma organização das tidas acima, sua ocupação se restringia ao lar e às leituras dos romances românticos.
O universo em que Capitu estava inserida era o mesmo de Luísa: um mundo definido conforme a ordem burguesa, delineada pelas mudanças acarretadas pela Revolução Francesa, a Revolução Industrial e o progresso. Capitu segue o protocolo ao se casar com Bentinho, salvando-se da exclusão social.Por ser Bentinho quem narra à história, não há conhecimento se as intenções de Capitu eram reais, se ela se casou com ele por amor ou por interesse. Podemos nem mesmo avaliar os sentimentos de Bentinho, a não ser o ciúme, que é o único afeto devotado à sua esposa até o final de sua vida.
O fator que mais aproxima Capitu de Luísa, não é o fato de ser adultera, mas sim, o universo de anulações governado por homens do qual elas fazem parte, e que era bem lembrado em ambas as obras. Pode se ver em Dom Casmurro, onde Capitu tem em seu próprio marido o narrador, este o qual reproduzindo a voz da ordem, acusando-a de infiel e guardando dela apenas traços de mulher manipuladora.
O mundo em Dom Casmurro, segundo John Gledson (2008) é mostrado como “um mundo muito conservador e atrasado”, como era, de fato, a sociedade daquela época, sendo o mesmo mundo mostrado em O Primo Basílio, através das limitações vividas por Luísa, que condena a mulher a não poder fazer escolhas e não ter o direito de explorar sua própria sexualidade sem ser reprovada.
Por isso, Luísa não pode ser considerada um mero objeto, pois tão obliqua quanto Capitu é para Bentinho, desvia-se para um lado que jamais lhe foi permitido. Sendo assim, podem-se unir Capitu e Luísa por suas limitações, e pela maneira como tem de se sujeitar ao casamento como único exercício legitimo de sua sexualidade e como único meio de serem incluídas na sociedade.
A principal diferença entre as duas mulheres é que Capitu (Dom Casmurro), inserida nos padrões da sociedade patriarcal, onde a mulher é limitada a passividade total, deve casar-se, porém, ela quem escolhe o marido. Já Luísa (Primo Basílio), mostra-se frágil, um objeto nas mãos do homem a quem deve causar seu destino.Em relação ao adultério, Luísa se supõe apaixonada pelo primo, mas na verdade se deixa levar pelas leituras e pela opinião leviana da amiga Leopoldina, enquanto em Dom Casmurro é apenas uma mera especulação.
A diferença entre Machado e Eça está no narrador. Mas ambos têm um mesmo foco que dá a matéria-prima de suas enunciações: a crítica à classe dominante. Eça vai direto ao ponto, através de uma narrativa construída em terceira pessoa. Ao passo que Machado trabalha o mesmo foco por trás de sutilezas exploradas pela narrativa construída em primeira pessoa.
Autores: Andressa Dias Geraldo, Nayara Alves Negrão e Thaís de Lima Kuceki.

Modernismo e a Questão do Regionalismo



Neste trabalho faremos uma breve análise de duas obras literárias que apesar de serem escritas em países com realidades diferentes, retratam uma fase modernista e o regionalismo. Uma delas é o grande expoente da literatura brasileira, Vidas Secas de Graciliano Ramos, a outra é As Vinhas da Ira de John Steinbeck.
Graciliano Ramos, na obra Vidas Secas, retrata um assunto de suma importância, publicada em 1938, o texto conta a história de uma família de retirantes sertanejos que levava uma vida sofrida em consequência da seca. Eles eram obrigados a deslocar-se em condições desumanas em busca de lugares que fossem menos castigados. Esta obra, sem dúvidas está entre os livros mais importantes da literatura brasileira tendo ganhado vários prêmios, dentro e fora do Brasil e considerada uma leitura obrigatória nos vestibulares das maiores universidades do país.
A obra As Vinhas da Ira de John Steinbeck, conta a história de uma humilde família que é obrigada a abandonar o território que ocupava e migrar em sentido a Califórnia devido as secas dos campos de algodão, tempestades de areia e o avanço tecnológico. As Vinhas da Ira é considerada uma obra-prima da literatura americana, um retrato fiel de um conflito entre os poderosos e aqueles que nada têm.
Dois autores em países e realidades diferentes tratam a problemática dos imigrantes como tema principal em suas obras. Além da migração como semelhança outro fator também chama a atenção, é o fato das obras terem sido publicadas na mesma década, meados de 30. Percebe-se que tanto o Brasil quanto os Estados Unidos passavam por mudanças políticas e sociais. Os livros trazem muito mais que a história de uma família, essas obras se tornam o grito desesperado de populações esquecidas vivendo em realidades desumanas e que infelizmente continuam atuais.  

*Trechos relevantes

               Em As Vinhas da Ira o personagem principal Tom Joad, volta para casa após sair da prisão e reencontra a sua família preparada para abandonar a sua terra em Oklahoma devido às fracas colheitas e a ocupação dos verdadeiros donos, possuidores de mais poder e maquinário. A família não vê alternativa a não ser seguir rumo a terra prometida da Califórnia. Durante o percurso, a família encontra com outras, que seguem na mesma direção em busca de trabalho e bons salários.
               Em Vidas Secas, Fabiano, Sinhá Vitória, dois meninos e uma cadela chamada Baleia, fogem da seca do sertão nordestino. Durante um caminho que parece interminável, os personagens passam por várias dificuldades, entre as quais, a fome e a sede. Em certo momento do texto, os retirantes encontram uma casa que parecia abandonada, mas logo chega o dono, para quem Fabiano oferece seus serviços. Após um período na fazenda em uma manhã bem cedo a família ganha a estrada continuando a busca por um lugar que traga felicidade a Fabiano e sua família.

*A razão do êxodo em cada obra

Na obra de Graciliano Ramos o êxodo é dado devido à seca, os personagens buscam um lugar que possa suprir as necessidades básicas para uma vida mais digna.
Em As Vinhas da Ira de John Steinbeck, os personagens também vêem na migração uma possibilidade de uma vida melhor. Terra, trabalho, alimento são objetivos almejados nesta obra.
Observa-se em ambas as obras, que os agentes causadores dá má condição de vida se referem onde eles vivem, lugares inóspitos e falta de propriedade são motivos de extrema relevância na razão do êxodo.

*Os valores da família

Em ambos os livros existem a figura matriarcal. Em Vidas Secas, apesar de todas as dificuldades a família se mantém unida.
Em As Vinhas da Ira os homens são mais amargurados pelas dificuldades que viveram, o que faz a família não deter um laço afetivo tão forte, os momentos difíceis contribuíram para um distanciamento afetivo mais notável nesta obra.

*A morte

Nas duas obras os personagens arriscam-se em busca de uma vida melhor, a morte os acompanha junto à vida sofrida e a aventura de conviver com o inesperado. Em As Vinhas da Ira o autor não se rende ao final feliz, nem a preservar os valores do sonho americano, pelo contrário ele fragiliza e descreve em detalhes sentimentos guardados a sete chaves como; medo, incerteza, rancor miséria e corações amargurados. O trecho em que Tio John recebe a missão de enterrar o filhinho recém-nascido de Rosa de Sharon, mas como protesto resolve colocar o bebê no leito de um rio para que o fluxo da água mostre aos seus inimigos o crime por eles cometido.
Em Vidas Secas, a luta pela sobrevivência, a falta de água e a fome é uma constante. Por esse motivo acabam se alimentando de seu próprio papagaio, no entanto a morte do outro animal de estimação a cachorra Baleia, é tratada com sofrimento e sentimento de perda, pela humanização que o autor atribuiu a cachorra. Ela era considerada um ente querido e sua perda abalou a família.

*O desfecho

Se alguém espera no livro As Vinhas da Ira surpreender-se com um final contrário a todo seguimento sofrido da história engana-se, pois John Steinbeck  leva o texto com realismo do início ao fim. Um desfecho marcado por uma enchente que como se não bastasse, leva o pouco que restava a família de Joad embora. Para se proteger da enchente eles entram em um galpão e encontram um garoto e seu pai que está mal, pois não se alimenta a dias, em um gesto piedoso Rosa com os seios cheios de leite, que deveria amamentar seu filho que morreu, oferece o alimento materno a boca de um estranho. O gesto mostra a dignidade humana sem limites, mesmo vivendo como animais largados com fome, nada justifica uma impossibilidade de salvar aquele homem. São valores perdidos por uns e conquistados por outros.
Vidas Secas acaba com Fabiano e sua família mudando-se mais uma vez com a mesma incerteza de sempre, com fome e sede, mas com a gigantesca esperança de dias melhores.  

*Conclusão

Duas ficções que retratam a busca constante por melhores condições de vida, que envolvem famílias amarguradas por motivos que até elas desconhecem. Nasceram em determinado lugar e situação, que infelizmente é desprivilegiada. São obras de autores de realidades diferentes, mas que mostram o assunto como um tema global. Obras antigas que continuam atuais exibem com clareza a ganância, o descaso por parte de uns e a esperança e solidariedade por parte de outros. Opostos que são universais, cada escritor com sua realidade, cada personagem com sua peculiaridade, mas ambos buscam mostrar uma realidade dura de seu país. As visões de mundo dos autores estão claras nas obras, eles tentam remeter o leitor à situação de seus personagens, buscam fazer com que o leitor sinta toda a miséria e sofrimento que é contada em detalhes na obra americana e explícita por frases curtas que traduzem a objetividade do autor em expressar a seca de quem vive no sertão, na obra brasileira.


Autores: Luciana A. de Macedo Gomes e Paulo José de Oliveira.

Romantismo e Modernismo no Brasil


A primeira fase do Romantismo no Brasil coincide com a chegada da família real portuguesa em 1808 e a Independência do Brasil em 1822. O movimento marca a história da literatura no Brasil e tem representantes que até hoje são lembrados com frequência.
O Romantismo tem características marcantes e bem diferentes de movimentos que antecedem-no como; o Quinhentismo (século XVI), Barroco (século XVII), Neoclassicismo ou Arcadismo (século XVIII). Com um estilo nostálgico e nacionalista, Gonçalvez Dias compondo em 1843 a Canção do Exílio marcou o Romantismo como uma nova fase que buscava um espírito criativo, libertador e sonhador. Porém as muitas leituras da Canção do Exílio mostram a evolução através dos tempos e a expansão de outros movimentos como o Modernista. Esse período teve sua emersão com a semana da arte de 1922. Os modernistas realizam uma aproximação crítica de obras do passado. A semana da arte de São Paulo foi a libertação para o novo, contra tudo que é instituído, antigos poemas nas mãos dos modernistas viraram paródia e crítica, uma fase rica em intertextualidade e criação.  



   

*Comparativo Canção do Exílio (Romantismo) – Gonçalves Dias X Poetas modernistas (Modernismo no Brasil)


Gonçalves Dias

 
CANÇÃO DO EXÍLIO

Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.

Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar — sozinho, à noite —
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

 Coimbra, julho de 1843








Poetas Modernistas

 Oswald de Andrade, 1925 

CANTO DO REGRESSO À PÁTRIA
Minha terra tem palmares
onde gorjeia o mar
Os passarinhos daqui
Não cantam como os de lá

Minha terra tem mais rosas
E quase que mais amores
Minha terra tem mais ouro
Minha terra tem mais terra

Ouro terra amor e rosas
Eu quero tudo de lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte para lá

Não permita Deus que eu morra
Sem que volte pra São Paulo
Sem que veja a Rua 15
E o progresso de São Paulo
 

 Mario Quintana, 1962 

UMA CANÇÃO

Minha terra não tem palmeiras...
E em vez de um mero sabiá,
Cantam aves invisíveis
Nas palmeiras que não há.

Minha terra tem relógios,
Cada qual com sua hora
Nos mais diversos instantes...
Mas onde o instante de agora?

Mas onde a palavra "onde"?
Terra ingrata, ingrato filho,
Sob os céus da minha terra
Eu canto a Canção do Exílio!


Carlos Drummond de Andrade, 1945
NOVA CANÇÃO DO EXÍLIO

Um sabiá na 
palmeira, longe. 

Estas aves cantam 
um outro canto. 

O céu cintila 
sobre flores úmidas. 
Vozes na mata, 
e o maior amor. 

Só, na noite, 
seria feliz: 
um sabiá, 
na palmeira, longe. 

Onde tudo é belo 
e fantástico, 
só, na noite, 
seria feliz. 
(Um sabiá, 
na palmeira, longe.) 

Ainda um grito de vida e 
voltar 
para onde tudo é belo 
e fantástico: 
a palmeira, o sabiá, 
o longe. 

Os textos acima mostram um pouco de uma vasta cadeia de releituras existentes a respeito da Canção do Exílio, cada autor faz a sua releitura conforme sua realidade, mas todos assumem uma postura inversa do texto original. A postura irreverente do modernista Oswald de Andrade que constrói uma paródia ao poema de Gonçalves Dias, o texto de Oswald tem palmares e distante de Coimbra se passa em São Paulo. Já o poeta  Mario Quintana deixa explícito o inverso a versão original, em seu poema Uma Canção, a terra não tem palmeiras, não tem sabiá e as aves são invisíveis.
A releitura de Carlos Drummond de Andrade vai além do nacionalismo e do amor pela pátria, ele desperta o imaginário maravilhoso que é associado à terra natal. Cada poeta adapta o poema a seu estilo e contexto sócio-político, diferente dos romancistas os modernistas procuram não se prender a regras anteriores buscam inovar sem medo da censura.
Análise geral do Romantismo e Modernismo

Análise semântica:

Percebe-se nos textos modernistas a presença de parônimos, palavras que apresentam significados diferentes embora sejam parecidas na grafia ou na pronúncia.

Paródia                                                       Canção do Exílio
Ex: Minha terra tem mais temores             Minha terra tem primores,
Que tais não há como acabar                   Que tais não encontro eu cá

Só de pensar sozinho à noite,                   Em cismar sozinho, à noite

Observa-se que nas paródias modernistas também foram empregados o uso de antônimos, os autores utilizaram a antonímia como um recurso para expressar a insatisfação com a degradação da natureza, objetivo contrário da Canção do Exílio que expressava saudade da pátria.   

Ex:
Um sabiá na 
palmeira, longe. 

Estas aves cantam 
um outro canto. 

Análise formal e temática:

Gonçalves Dias em seu poema deixa claro o laço afetivo que existe entre ele e a pátria amada, a preocupação e o saudosismo com sua terra natal também ficam explícitos no texto. O poema foi escrito em Portugal em um período em que Gonçalves Dias estudava Direito, no ano de 1843. A Canção do Exílio marca a  primeira fase romancista, o texto evidencia trechos que exprimem absoluto amor e medo de não poder voltar para o Brasil para maravilhar-se com o canto dos pássaros, os bosques e suas belezas. A Canção do Exílio foi tão significativa que um trecho foi usado no Hino Nacional brasileiro.  

Trecho da Canção do Exílio no qual o autor exprime a paixão pela terra natal:   

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Nas poesias modernistas os autores se preocupam em enfatizar problemas sociais e políticos. Paródias que com tom de ousadia e humor também expressam o amor pela pátria, mas de forma distinta a fase romântica.

Trecho da Nova Canção do Exílio de Carlos Drummond de Andrade.

Ainda um grito de vida e 
voltar 
para onde tudo é belo 
e fantástico: 
a palmeira, o sabiá, 
o longe. 


Intertextualidade e estilização:

A intertextualidade ocorre com Gonçalves Dias na Canção do Exílio, inspirada após a leitura de Wolfgang Goethe e com os diversos poetas modernistas que intertextualizaram de diferentes maneiras a obra de Gonçalves Dias. A estilização também contida nos textos é explícita nas concordâncias entre linhas gerais, no campo de ideias. Cada obra com sua particularidade, mas todas acabam se encontrando em um contexto amplo, buscam uma reflexão social, cada qual respeitando sua época e lugar. As relações texto e autor vem surgindo com o tempo, conforme o autor lê e assimila, logo insere em seu próprio texto. Esse diálogo entre textos dá continuidade literária e faz com que aja a sobrevivência da prática poética.

Autores: Luciana A. de Macedo Gomes e Paulo José de Oliveira.