sábado, 2 de julho de 2011

Romantismo e Modernismo no Brasil


A primeira fase do Romantismo no Brasil coincide com a chegada da família real portuguesa em 1808 e a Independência do Brasil em 1822. O movimento marca a história da literatura no Brasil e tem representantes que até hoje são lembrados com frequência.
O Romantismo tem características marcantes e bem diferentes de movimentos que antecedem-no como; o Quinhentismo (século XVI), Barroco (século XVII), Neoclassicismo ou Arcadismo (século XVIII). Com um estilo nostálgico e nacionalista, Gonçalvez Dias compondo em 1843 a Canção do Exílio marcou o Romantismo como uma nova fase que buscava um espírito criativo, libertador e sonhador. Porém as muitas leituras da Canção do Exílio mostram a evolução através dos tempos e a expansão de outros movimentos como o Modernista. Esse período teve sua emersão com a semana da arte de 1922. Os modernistas realizam uma aproximação crítica de obras do passado. A semana da arte de São Paulo foi a libertação para o novo, contra tudo que é instituído, antigos poemas nas mãos dos modernistas viraram paródia e crítica, uma fase rica em intertextualidade e criação.  



   

*Comparativo Canção do Exílio (Romantismo) – Gonçalves Dias X Poetas modernistas (Modernismo no Brasil)


Gonçalves Dias

 
CANÇÃO DO EXÍLIO

Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.

Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar — sozinho, à noite —
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

 Coimbra, julho de 1843








Poetas Modernistas

 Oswald de Andrade, 1925 

CANTO DO REGRESSO À PÁTRIA
Minha terra tem palmares
onde gorjeia o mar
Os passarinhos daqui
Não cantam como os de lá

Minha terra tem mais rosas
E quase que mais amores
Minha terra tem mais ouro
Minha terra tem mais terra

Ouro terra amor e rosas
Eu quero tudo de lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte para lá

Não permita Deus que eu morra
Sem que volte pra São Paulo
Sem que veja a Rua 15
E o progresso de São Paulo
 

 Mario Quintana, 1962 

UMA CANÇÃO

Minha terra não tem palmeiras...
E em vez de um mero sabiá,
Cantam aves invisíveis
Nas palmeiras que não há.

Minha terra tem relógios,
Cada qual com sua hora
Nos mais diversos instantes...
Mas onde o instante de agora?

Mas onde a palavra "onde"?
Terra ingrata, ingrato filho,
Sob os céus da minha terra
Eu canto a Canção do Exílio!


Carlos Drummond de Andrade, 1945
NOVA CANÇÃO DO EXÍLIO

Um sabiá na 
palmeira, longe. 

Estas aves cantam 
um outro canto. 

O céu cintila 
sobre flores úmidas. 
Vozes na mata, 
e o maior amor. 

Só, na noite, 
seria feliz: 
um sabiá, 
na palmeira, longe. 

Onde tudo é belo 
e fantástico, 
só, na noite, 
seria feliz. 
(Um sabiá, 
na palmeira, longe.) 

Ainda um grito de vida e 
voltar 
para onde tudo é belo 
e fantástico: 
a palmeira, o sabiá, 
o longe. 

Os textos acima mostram um pouco de uma vasta cadeia de releituras existentes a respeito da Canção do Exílio, cada autor faz a sua releitura conforme sua realidade, mas todos assumem uma postura inversa do texto original. A postura irreverente do modernista Oswald de Andrade que constrói uma paródia ao poema de Gonçalves Dias, o texto de Oswald tem palmares e distante de Coimbra se passa em São Paulo. Já o poeta  Mario Quintana deixa explícito o inverso a versão original, em seu poema Uma Canção, a terra não tem palmeiras, não tem sabiá e as aves são invisíveis.
A releitura de Carlos Drummond de Andrade vai além do nacionalismo e do amor pela pátria, ele desperta o imaginário maravilhoso que é associado à terra natal. Cada poeta adapta o poema a seu estilo e contexto sócio-político, diferente dos romancistas os modernistas procuram não se prender a regras anteriores buscam inovar sem medo da censura.
Análise geral do Romantismo e Modernismo

Análise semântica:

Percebe-se nos textos modernistas a presença de parônimos, palavras que apresentam significados diferentes embora sejam parecidas na grafia ou na pronúncia.

Paródia                                                       Canção do Exílio
Ex: Minha terra tem mais temores             Minha terra tem primores,
Que tais não há como acabar                   Que tais não encontro eu cá

Só de pensar sozinho à noite,                   Em cismar sozinho, à noite

Observa-se que nas paródias modernistas também foram empregados o uso de antônimos, os autores utilizaram a antonímia como um recurso para expressar a insatisfação com a degradação da natureza, objetivo contrário da Canção do Exílio que expressava saudade da pátria.   

Ex:
Um sabiá na 
palmeira, longe. 

Estas aves cantam 
um outro canto. 

Análise formal e temática:

Gonçalves Dias em seu poema deixa claro o laço afetivo que existe entre ele e a pátria amada, a preocupação e o saudosismo com sua terra natal também ficam explícitos no texto. O poema foi escrito em Portugal em um período em que Gonçalves Dias estudava Direito, no ano de 1843. A Canção do Exílio marca a  primeira fase romancista, o texto evidencia trechos que exprimem absoluto amor e medo de não poder voltar para o Brasil para maravilhar-se com o canto dos pássaros, os bosques e suas belezas. A Canção do Exílio foi tão significativa que um trecho foi usado no Hino Nacional brasileiro.  

Trecho da Canção do Exílio no qual o autor exprime a paixão pela terra natal:   

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Nas poesias modernistas os autores se preocupam em enfatizar problemas sociais e políticos. Paródias que com tom de ousadia e humor também expressam o amor pela pátria, mas de forma distinta a fase romântica.

Trecho da Nova Canção do Exílio de Carlos Drummond de Andrade.

Ainda um grito de vida e 
voltar 
para onde tudo é belo 
e fantástico: 
a palmeira, o sabiá, 
o longe. 


Intertextualidade e estilização:

A intertextualidade ocorre com Gonçalves Dias na Canção do Exílio, inspirada após a leitura de Wolfgang Goethe e com os diversos poetas modernistas que intertextualizaram de diferentes maneiras a obra de Gonçalves Dias. A estilização também contida nos textos é explícita nas concordâncias entre linhas gerais, no campo de ideias. Cada obra com sua particularidade, mas todas acabam se encontrando em um contexto amplo, buscam uma reflexão social, cada qual respeitando sua época e lugar. As relações texto e autor vem surgindo com o tempo, conforme o autor lê e assimila, logo insere em seu próprio texto. Esse diálogo entre textos dá continuidade literária e faz com que aja a sobrevivência da prática poética.

Autores: Luciana A. de Macedo Gomes e Paulo José de Oliveira.

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